quarta-feira, 16 de julho de 2014

A ILHA


No fim de semana passado peguei na família, enfiei-os dentro do carro e vá de rumar ao sul.
 
Cento e setenta quilómetros depois, chegámos ao nosso destino. O parque de campismo da Ilha do Pessegueiro.
 
Embora ainda revele algumas semelhanças com o que se lhe conhecia, cresceu. Ocupa agora uma área maior, tem mais espaço para tendas, roulottes e afins. Tem também disponíveis, mais apartamentos e bungalows.
 
A dar-nos as boas vindas tivemos a voz fanhosa da recepcionista, de imediato reconhecida pela Catarina, a única de nós que já lá havia estado.
 
Ao instalarmo-nos, enquanto desvendávamos “os segredos à casa” apercebemo-nos da magnífica vista do alpendre.


 
No meio do azul, partilhando um horizonte de água salgada, lá estava ela.
 
Uma ilha em si, é já berço do misticismo exógeno de quem nunca a pisou. Aliada a uma lenda, sedimenta o etéreo, tornando-o capaz de suportar os apertados abraços de Poseidon.
 
E a Catarina contava como ela, o Carlos e talvez o seu avô (já não se lembra bem) há vinte e poucos anos atrás, lá haviam chegado a nado, saídos do areal da costa, num dia de Verão, com mar calmo e maré vazia.
 
Segundo ela, a ilha pouco ou nada tinha de interessante, apenas ninhos de aves e algumas ruínas do forte que ali existira em tempos. Do pessegueiro, nem vestígios, a ilha só tinha rochas e arbustos.
 
Apesar desta “desromantização” da ínsula, há algo em mim que anseia por conhecer aquele espaço. Não fosse o cansaço da viagem, acumulado com uma semana de stress laboral, o vento, a maré alta e a corrente, teria feito a travessia a nado nesse mesmo dia.
 
Após um par de horas na praia, um banho e jantar, fomos todos dormir.
 
A noite foi de alguma agitação, pois o Tiago, no auge dos seus cinco aninhos, ainda anda em fase de largar a fralda da noite.
No dia seguinte, despertámos para a humidade de uma manhã cinzenta.
 
Quem conhece a costa Vicentina sabe que muitas vezes isso não é mais do que o prenúncio de uma tarde de braseiro, mas dias há em que a bruma teima em não se ir embora e a ida à praia se fica apenas pela intenção.
 
Há que ser optimista! Aquele iria ser o melhor dia do ano!
 
E lá fomos, acompanhados do lanche e das tralhas estivais, para o meio de um areal húmido, esperançosos de que o rei Sol vislumbrasse uma saída do labirinto escuro onde se perdera.
 
A lua cheia do dia anterior descansava ainda noutro hemisfério e o mar, querendo chegar-se a ela, distanciara-se da costa, deixando a nú os inúmeros rochedos, pedaços de pedra rasgada que o rigor do Inverno destapara no auge da sua cólera, engolindo o enorme manto de areia que até então os cobrira.
E num horizonte de espessa névoa, apenas a espuma das ondas se destacava.
 
Os meus filhos perguntavam: - Pai, onde está a Ilha? Não se consegue ver a ilha! Mas ela está lá, não está?
 
Nem sinal dela! Eclipsada pela bruma, troçava dos nossos sentidos. Apenas o barulho das gaivotas e restante companhia alada, nos faziam desconfiar da sua presença.
 
E pouco a pouco, enquanto eles brincavam comigo no extenso areal, a névoa foi-se dissipando e o pequeno pedaço de terra, parecendo emergir lentamente da água, decidiu aparecer. Não sem antes brincar um pouco às escondidas connosco, pois tão depressa se exibia num pequeno vislumbre, como logo a seguir voltava a desaparecer.
 
"E o pessegueiro?" Pensava eu. Mas que raio! Como poderia uma árvore ter medrado e sobrevivido, naquele pedaço de terra de aparência inóspita, permanentemente invadido por dezenas de aves inquietas e barulhentas?
 
E na distância, vislumbrava a meio da costa da ilha, um pequeno cais flutuante e um barquito que, a espaços, lá atracava carregado de gente. E lá se viam não mais do que uma dúzia de cabecitas, passeando pelos parcos caminhos abertos no meio dos arbustos e das rochas, espreitando o topo da ilha, no interior do que visto da orla costeira, se assemelhava às ruínas de um pequeno forte.
 
“Eu, se quiser, apesar da corrente, consigo lá chegar a nado! Mmmmm… e depois se o Pedro também quiser ir comigo? É melhor não. Haverá outra oportunidade, certamente. Até porque lá chegado, como reagiria o barqueiro que por lá passeia aquelas gentes? Melhor não!”
 
Após um maravilhoso dia de praia em família, regressámos finalmente a casa, passeando pela costa até à marginal de Sines e daí, rumo à Autoestrada em direcção a Almada.
 
Deixámos a ilha lá longe, sossegada, entregue às suas lendas, às suas ruínas, às aves e seus ninhos, àquele barqueiro e às cabecitas que ele por lá faz passear.
 
Entretanto, a trova soava continuamente na minha cabeça: “Havia um pessegueiro na ilha, plantado por um Vizir de Odemira, que dizem por amor se matou novo, aqui, no lugar de Porto Covo”.
 
Donde diabo saíra aquela estória? Teria alguma base histórica ou seria apenas uma invenção destinada a romancear a paisagem, de forma a torná-la ainda mais bela?
 
E vai daí, decidi investigar… Se também estiverem curiosos, podem encontrar as respostas aqui:

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